Donatello
Um dia reparas que começaste a ir às compras de fato de treino, que andas sempre apressada no meio da rua, que encomendas tudo online, até as compras de supermercado. Já não fazes transferências, mas passas cheques. Entre semana toda a comida que compras é para levar; bebes o café a andar ou no trabalho; deixaste de te sentar nos cafés e restaurantes. Quando dás por ela já não olhas de lado para as pessoas estranhas do metro.
Há sempre indivíduos singulares nas carruagens de metro. E não falo só de estilo. Podes ter a sorte de ouvir um discurso religioso a incentivar-te a redimires-te dos teus pecados. Podes apenas ter o azar de alguém com um rabo verdadeiramente americano se sentar à tua beira, enquanto come cheetos (na realidade a culpa é dos assentos demasiado pequenos para o cidadão comum). E depois ainda podes ter a sorte de te deparares com os inigualáveis clichés americanos. Dois polícias de fardas impecáveis e aspeto duro a sair de uma carruagem; um apelidado Morales e um negro de bigode chamado McDonald. Mas as surpresas não ficam por aí.
Tinha pensado em dizer-vos que das famosas pragas (baratas, ratazanas, crocodilos), só tinha visto esquilos. Esses sim, em todo o lado e até se atravessam à minha frente a correr. Teria sido precipitado.
Ainda ontem estavam duas destas na estação de metro. E não estavam nos carris como costuma ser normal, mas na plataforma. Pareciam perfeitamente indiferentes a quem passava, e não éramos poucos.
Também em casa consigo ser surpreendida (e não só pela sujidade).
Por outro lado já não é nenhuma surpresa chegar a casa e ter o meu microondas a cheirar a pipocas. Todos os dias, a todas as horas. Pequeno almoço, almoço e jantar. E há sempre alguns pacotes vazios no caixote de lixo. E passando pelo corredor não é muito estranho também ouvir risos altos vindos de um dos quartos, com o ruído de uma televisão no fundo.
Esta sexta-feira não houve beer time. Porque fomos à happy hour de patologia. Basicamente uma vez por mês o departamento compra comida e cerveja para todos irmos conviver durante umas horas. O convívio passou por nos queixarmos do departamento, que agora só faz happy hour mensalmente (antes era de quinze em quinze dias) e que reduzir à comida.
Nessa happy hour fui introduzida ao conceito de asian glow, o estado embriagado de quem possui a devida variante genética da ADH.
Entretanto também me tornei especialista em perguntas de quebrar o gelo tipicamente americanas, que nunca me teriam ocorrido. Durante toda a minha vida nunca fui inquirida sobre se era a primeira "médica" na família. Nestas três semanas já mo perguntaram pelo menos quatro vezes. E parece que o facto do meu pai partilhar o mesmo ramo profissional explica muita coisa. Todos terminam com um "humm" conhecedor. Outra pergunta que morres por fazer mal conheces uma pessoa é se ela tem irmãos. Mas convém estares preparada para responder acerca de idades, profissão/ocupação e até semelhanças físicas.
Se te vires enrascado, num sítio com tantos estrangeiros é sempre uma ótima ideia inquirir acerca de desejos de sair/ficar nos maravilhosos US of A.
Se calhar devia ter ido ao workshop do post anterior, porque me senti um bocado perdida ontem. Fui a uma festa num rooftop por Hell's Kitchen. A festa era de uma maioria asiática, com bastantes holandeses à mistura e um ou outro raro americano. Havia três telhados ligados e atravessamos para o terceiro, com a melhor vista, apenas para voltar para trás após as queixas do vizinho do segundo telhado. Não se queixou do ruído da música, mas tinha medo que algum de nós torcesse um tornozelo e o processasse.
Falando com os outros convidados, parecia que todos tinham viajado imenso e conheciam meio mundo. Quando respondi a algum que a minha vida era aborrecida em comparação, ele disse-me só para olhar em volta.
Agora percebo porque as pessoas em intercâmbio e couchsurfing perguntam tanto sobre os irmãos...
ReplyDeleteDe que é a Oreo? :P
Não sei, sabia a oreo normal :p
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